top of page

O que é mais forte: O medo da barragem ou o medo do desemprego?


A pesar do peso que exerce no contexto da economia em Minas Gerais, a mineração vem sendo contestada por uma parcela expressiva da sociedade mineira, mesmo naqueles municípios onde a atividade é preponderante. E o motivo é, principalmente, o medo dos acidentes como os que ocorreram em Mariana e Brumadinho. Mas ao mesmo tempo em que teme os acidentes e a insegurança gerada pelas barragens de rejeito, a população o também se aflige com os problemas econômicos gerados com a paralisação da atividade, notadamente o desemprego, como assinala o professor Ricardo Ruiz, da UFMG, um dos defensores da mineração. Ele enfatiza que a mineração sempre teve um peso importante na economia de Minas Gerais, lembrando que, em 2010 a indústria extrativa mineral participava com 5,7% do PIB mineiro e chegou a um pico de 7,5% em 2013, durante o chamado Superciclo do minério de ferro. “Este foi o índice mais alto registrado durante o Superciclo, que começou em 2005/2006 e se estendeu até 2013. Mas em 2015 houve a quebra do ciclo e a importância da mineração no PIB do estado teve uma redução abrupta, caindo para 3%”, diz ele. Analisando-se em termos do Valor Adicionado pela indústria mineral na economia mineira (incluindo petróleo e gás), o pico ocorreu em 2011 e 2013, também com 7,5%, conforme os números constantes no Diagnóstico do Setor Mineral em Minas Gerais, elaborado pela SEDE (Secretaria de Desenvolvimento Econômico), com vistas à elaboração do Plano Estadual de Mineração que o governo está encomendando. Esse período coincide com o pico dos preços do minério de ferro. Em 2015 houve uma queda forte, para 3,6% e no ano seguinte (2016) o tombo foi maior ainda: 2,9%. O Diagnóstico ainda mostra que, entre 2002 e 2016, a média do Valor Agregado foi de 4,0%.

Já quando se trata da comparação com o Valor Agregado gerado por toda a indústria de Minas Gerais, no mesmo período (ou seja, entre 2002 e 2016), verifica-se que a indústria mineral participou com 13,2%. “Observou-se tendência de elevação da participação da Indústria Extrativa Mineral do Estado de 2008 até 2013, com exceção de 2009, acompanhando os preços internacionais do minério de ferro. A partir de 2014, há expressiva perda de participação da Indústria Extrativa Mineral que se estende até 2016”, informa o Diagnóstico. Ruiz reitera que, apesar da diversidade da atividade econômica no estado, a dependência do PIB em relação à indústria extrativa mineral, principalmente do minério de ferro, ainda é muito grande. A mineração representa muito para o estado em termos de geração de riqueza e empregos. E há um contingente de municípios em que existe grande concentração da atividade mineradora, particularmente da grande mineração de ferro, que há muito tempo é o carro- -chefe da mineração em Minas Gerais, que gera uma grande quantidade de empregos e que está concentrada em algumas plantas industriais. “A extração de minério de ferro é industrial (indústria extrativa mineral) e extremamente concentrada, o que gera uma concentração de riqueza e empregos em algumas partes de Minas Gerais, já que é no Quadrilátero que está concentrada a mineração de ferro (daí o nome Quadrilátero Ferrífero)”, afirma Ruiz, acrescentando que esta mineração está voltada para a exportação, atua no mercado internacional e por isso sofre as consequências dos altos e baixos na demanda e comportamento dos preços.

O professor lembra que em 2015 a indústria mineral no estado chegou ao fundo do poço, quando ocorreu a ruptura da barragem de rejeitos do Fundão, em Mariana, no final daquele ano. O valor da produção de minerais metálicos, conforme mostra o Diagnóstico da SEDE, caiu de um pico de R$ 45,5 bilhões, em 2013, para R$ 33,3 bilhões em 2015, basicamente em função da queda de preços do minério de ferro. Em 2016, ainda sob influência do acidente de Mariana, o valor da produção teve um pequeno aumento, passando para R$ 34,1 bilhões. Nos dois anos seguintes os preços do minério de ferro foram melhorando e o valor da produção mineral no estado chegou a R$ 42,0 bilhões em 2018. Mas em 2019, quando a indústria já ensaiava uma recuperação, houve a ruptura da barragem da Vale em Brumadinho e a produção da empresa, principal produtor de minério de ferro, foi reduzida no estado, já que a operação de algumas barragens de rejeito foi suspensa. O professor observa que a produção de minério de ferro no estado não está crescendo no mesmo ritmo que no Brasil. “Minas Gerais atingiu o seu pico de produção em 2016, quando chegou a 194 milhões t. Em 2019, chegou a 139 milhões t, um volume abaixo do que registrava em 2011. Enquanto isso, no Pará, está sendo desenvolvida uma outra mineração, concorrente ou complementar a Minas Gerais, com um projeto como o S11D, da Vale. Assim, enquanto Minas Gerais saía de 165 milhões t, alcançava 194 milhões t e hoje já caiu para 140 milhões t, o Pará saiu de uma produção de 97 milhões t e chegou a 190 milhões t. É como se ocorresse uma troca de posição. O Pará hoje é o grande exportador de minério de ferro e não mais Minas Gerais. Quando ocorreu essa redenção? Em 2017, com a entrada em operação do projeto S11D. Então hoje Minas Gerais tem uma concorrência dentro do Brasil, de um minério mais rico e menos agressivo. Portanto, Minas Gerais, onde a mineração de ferro começou há quase 80 anos, tem um desafio concorrencial e competitivo dentro do País. E lá fora temos outros desafios, como o minério produzido na Austrália e o que se pretende produzir na África, conforme se especula”. Essa situação, na opinião de Ruiz, coloca um desafio para Minas Gerais, que é o de diversificação, já que talvez o minério de ferro tenha alcançado seu pico de produção em Minas Gerais há quatro anos. Ele ressalta que a produção em Minas Gerais está concentrada basicamente em 20 municípios, que evidentemente não têm apenas minério de ferro (há o caso do nióbio, em Araxá, que tem peso importante no valor da produção). Esses 20 municípios respondem por 93% da CFEM e estão no entorno da região metropolitana, como é o caso de Mariana, Ouro Preto, Nova Lima e Brumadinho. E têm uma grande dependência da riqueza criada pela mineração. Há casos em que a CFEM chega a 25% da receita do município, sendo usado para cobrir gastos com educação, coleta de lixo, saúde e transporte. Os recursos permitem que o município preste serviços que são muito necessários, principalmente para a população carente. O professor observa que a mineração em Minas Gerais ainda é muito grande – só que concentrada – e a riqueza por ela gerada é distribuída para o estado via geração de empregos, renda e tributos. Assim, segundo ele, a mineração ainda é muito importante em Minas Gerais, apesar do esforço de diversificação econômica que ocorreu no estado desde a década de 1950 e particularmente na década de 1960, quando foram criadas instituições de fomento como o BDMG, o INDI, a Metamig (hoje Codemge). Em razão disso, preconiza que os municípios mineradores criem instrumentos que permitam fomentar uma economia mais diversificada e menos dependente da mineração. Atualmente, em sua opinião, esses municípios vivem sob o medo dos choques econômicos provocados pela retração da mineração. “Imagine-se o caso de um município que tem 50 mil habitantes, uma operação de mineração que responde por 20% do emprego e de repente a empresa paralisa as atividades ou deixa de existir. Isto produz uma queda violenta no nível de emprego e no bem-estar da população. O mesmo ocorre quando há a exaustão das minas. Ao não existir uma atividade que substitua a mineração, ocorre um esvaziamento da cidade. Vimos esse temor em Mariana, e agora também em Brumadinho. A questão, portanto, é: como usar a mineração para produzir algo diferente, uma economia diferente da mineração? Essa é a mágica do desenvolvimento: transformar. Ir além da mineração”, diz o professor. Ele reforça o que ocorreu no período recente em Minas Gerais. A mineração de ferro atingiu seu pico em 2016. E começou a cair.

Reduziu-se o nível de produção e ao mesmo tempo foram acionadas as máquinas no projeto S11D, no Pará. Além disso, novas minas entrarão também em operação na África e Austrália. “Ou seja, Minas tem o desafio de encontrar meios para ir além da mineração. É um desafio para o estado e também para os 20 municípios que dependem da mineração de ferro. Um outro desafio gerado pela ruptura das barragens em Mariana e Brumadinho é: como ter a mineração segura e socialmente aceitável? Como manter essa atividade, contestada, em um novo formato?”, indaga. Nesse sentido, ele considera que, hoje, eliminar as barragens é o ponto central da mineração em Minas Gerais, inclusive porque não existem tecnologias prontas para isso. Elas ainda estão sendo desenvolvidas. “Após o rompimento da barragem em Brumadinho, virou condição de sobrevivência o desenvolvimento de um novo processo de extração de minério de ferro ambientalmente seguro e socialmente aceitável. Porque o que temos até agora não é mais tolerável. Isto coloca um desafio não somente para Minas Gerais, mas para as empresas que estão aqui. Para Minas Gerais coloca o desafio de incentivar, criar uma política de estado para que tenhamos tecnologias alternativas que permitam continuar essa mineração. Ao mesmo tempo, é preciso criar alternativas à mineração, porque em algum momento haverá a exaustão da mina. E mesmo antes da exaustão da mina há um outro desafio: esse minério é competitivo com o que é produzido na Austrália, África ou Pará?” Concluindo, ele afirma que atualmente há uma contestação à mineração em Minas Gerais sob vários aspectos, que dependência da grande mineração de ferro ainda é muito forte e que essa dependência faz com que “as pessoas tenham medo tanto da barragem quanto do desemprego”. Na mesma linha, a professora Virgínia Ciminelli, também da UFMG, lembra que os recursos minerais são uma riqueza – como outros recursos naturais que há no estado e que devem ser também levados em consideração – mas são finitos. Em razão disso, ela menciona um conceito hoje considerado muito importante, que é o da prosperidade sustentável, proposto pela doutora Doris Hiam-Galvez. “Essa prosperidade sustentável é o conceito em que se deve aproveitar aquele momento, aquele período de riqueza, para planejar o futuro já sem a riqueza mineral. Pensando, por exemplo, na reconversão do território e em sua diversificação econômica. Isso certamente exige acordos entre governo, empresa, comunidade; exige uma comunicação por confiança, para se chegar a esse acordo, e projetos de reconversão de várias naturezas, para darem suporte a esse planejamento, novos arranjos, recursos e continuidade”. Mas, ao seu ver, falta financiamento de projetos, bem como lideranças comprometidas e responsáveis. 



Fonte: Brasil Mineral

0 comentário
bottom of page