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Mineração na bolsa, como viabilizar novos mecanismos de financiamento?



Por Frederico Bedran Oliveira * e Mariana Clara de Freitas Fontineli **



A importância da disponibilidade de crédito para promover a mineração no território nacional não é discussão nova. A indústria mineral é intensiva em capital e, no Brasil, à exceção dos minerais radioativos, é o capital privado que viabiliza a atividade, de modo que o acesso a mecanismos de financiamento é fundamental para a implantação e expansão de empreendimentos minerários.

O cenário da pandemia de Covid-19 impôs efeitos danosos sobre a vida humana, nas mais diversas dimensões. No aspecto econômico, projeções apontam quedas significativas no PIB brasileiro, com impactos acentuados nos investimentos. 

O movimento de recuperação econômica do País requererá do Poder Público atenção especial no que se refere ao desenho de políticas e medidas que ampliem e garantam a atratividade aos investimentos privados, especialmente nos setores de infraestrutura e mineração.

É nesse contexto que a mineração poderá exercer papel de destaque no processo de retomada, tanto por sua já relevante participação no cenário econômico nacional - o setor responde por 2,6% do PIB brasileiro - quanto por seu potencial de expansão.

A despeito da importância da indústria mineral para a economia nacional, o setor ainda opera abaixo de seu potencial, havendo amplo e reconhecido espaço para crescimento. 

Nos anos mais recentes, os entraves domésticos se somaram à conjuntura global para produzir um cenário em que o Brasil - apesar de sua extensão territorial, riqueza geológica e tradição minerária - não figura entre os países que mais recebem investimentos privados em mineração, estacionado no patamar de 3% dos dispêndios em pesquisa mineral do mundo. 

Enquanto nos mantemos nessa posição, observamos outros países da América do Sul, como Chile e Peru, ganharem cada vez mais espaço. 

Então, se, por um lado, o desenvolvimento da mineração passa pelo acesso a mecanismos de financiamento, por outro, o que se observa é que a oferta de crédito tradicional tem perdido força em vários países do mundo. O risco associado à pesquisa mineral e a volatilidade dos preços das commodities metálicas parecem estar entre os fatores que têm impactado na disponibilidade de crédito ao longo dos últimos anos. 

É sob essa ótica, que, explorar o potencial da indústria mineral nacional e convertê-la em um dos vetores da retomada econômica no pós-pandemia, requer engajamento para pensar, implementar e dar efetividade a políticas que ampliem a disponibilidade de recursos financeiros e o acesso a novos mecanismos de financiamento.

Com a redução do crédito via fontes tradicionais, o setor tem recorrido a mecanismos alternativos de financiamento, como emissão de ativos, fundos privados, concessão de benefícios ao investidor e contratos  de royalties e de streaming. Diversos países têm reconhecido a importância do financiamento para o desenvolvimento da atividade, adotando políticas específicas para ampliar o acesso a recursos financeiros, tanto pelo incentivo à criação de fundos domésticos quanto pela captação de recursos em fundos ou bolsas estrangeiras.

Essa visão geral, que aponta para as necessidades, tendências e soluções em nível global, mostra que os investimentos em mineração permanecem se realizando, seja por fontes tradicionais ou alternativas. Ao setor mineral brasileiro, cumpre internalizar essa nova dinâmica. 

O movimento parece dar os seus primeiros passos, a exemplo do IPO realizado pela Aura Minerals, na B3, em oferta de R$ 790 milhões. O feito inédito, de lançamento de ações em bolsa brasileira por uma empresa  junior de mineração, reafirma as oportunidades pouco exploradas pelo setor mineral, que poderão ser ampliadas com as medidas de incentivo e com a inclusão definitiva da mineração no mercado financeiro nacional, beneficiando tanto a pesquisa mineral quanto projetos pré-operacionais.

Quanto aos fundos de investimento, atualmente, no Brasil, a legislação prevê a captação de recursos no mercado de capitais, com benefícios fiscais ao investidor, para o financiamento de projetos de setores considerados prioritários pelo governo, com destaque para as debêntures incentivadas, instituídas pelo Lei nº 12.431/2011 e cujas emissões, desde a sua instituição, já somaram cerca de R$ 100 bilhões. Ou, ainda, os fundos FI-Infra e os fundos de investimento em participação em infraestrutura - FIP-IE, estes instituídos pela Lei nº 11.478/2007. 

Ocorre que, de forma equivocada, a mineração não figura no rol de beneficiários, entendendo-se imperiosa a sua inclusão. 

É premente, portanto, um esforço de todo o setor mineral para permitir que os mecanismos mais modernos de financiamento sejam implementados em nosso País, atraindo novos investidores e mais investimentos.

Na esteira das políticas do governo para atrair investimentos, como a ampliação da oferta de áreas, desburocratização, implantação dos conceitos internacionais de recursos e reservas e o uso do título minerário como garantia de financiamento, novos mecanismos de financiamento poderão tomar papel importante não apenas no que tange a viabilizar empreendimentos, mas a contribuir para a modernização do setor. Isso porque podem se tornar via de promoção do desenvolvimento sustentável, da responsabilidade socioambiental, da ética e da transparência, ao exigir das empresas tomadoras a assunção de compromissos e oferecer incentivos a pequenas e médias empresas.

Os benefícios para a promoção da sustentabilidade não advêm de dedução, mas de fatos. No contexto da captação de recursos via compra e venda de ativos para o financiamento de projetos, o que se observa é uma tendência de preferência pelos "projetos verdes". Vide o crescimento dos green bonds, ativos voltados a projetos ambientalmente corretos, e dos fundos ESG, voltados ao financiamento de projetos sustentáveis. 

Em suma, trata-se de pensar, de forma urgente, um cenário de inclusão da mineração no sistema financeiro nacional, ressaltando que, para além das políticas de incentivo e de medidas de regulamentação, é necessária uma postura do setor no sentido de aprimorar a aplicação das ferramentas de engenharia financeira aos projetos e atuar com responsabilidade socioambiental. Assim será possível avançar no objetivo comum de colocar a mineração brasileira em posição estratégica, como indutora do desenvolvimento do País, atraindo, ainda, investimentos para a sua cadeia de fornecedores, promovendo crescimento econômico e desenvolvimento regional. 

A discussão não é nova, mas diante da conjuntura econômica atual e das demandas sociais mais recentes, os desafios não são os mesmos. Alcançar a mineração do futuro, aquela que desejamos e que muito pouco guarda da mineração do passado, requer disrupção.




* Frederico Bedran Oliveira é Geólogo. Advogado. Mestre em Geologia Econômica e Exploração Mineral (UnB). Diretor do Departamento de Geologia e Produção Mineral do Ministério de Minas e Energia.


** Mariana Clara de Freitas Fontineli é Geóloga, graduanda em Direito, pós-graduada em Gerenciamento de Projetos (FGV). Analista em Infraestrutura do Ministério de Minas e Energia.



Fonte: Brasil Mineral


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