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O “novo normal” na indústria de Agregados


Por Fernando M. Valverde


Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, SARS-CoV2, uma pandemia.  No Brasil, poucos dias depois desse anúncio, o setor de mineração foi incluído entre as atividades consideradas essenciais que não podem parar.

A indústria de agregados fez todos os ajustes necessários para garantir a continuidade das operações com segurança para os trabalhadores e para as comunidades onde atuam. Comprova a eficácia das medidas tomadas a ocorrência de poucos registros de funcionários infectados desde o início da pandemia.

O impacto da Covid-19 sobre a economia de 2020 já está bastante visível: O Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê que o produto interno bruto (PIB) diminuirá em cerca de 3% em todo o mundo, ficando 5,9% abaixo dos 2,9% de 2019. O efeito será diferente em cada região do globo. O setor da construção europeu estima uma retração de 60 a 70% na sua atividade. Nos Estados Unidos, já se projetam demissões em massa neste segmento. Por outro lado, dados mostram que, na China, a construção, entre outros setores, aparenta uma retomada desde março / abril de 2020.

No Brasil, a construção civil somente passou a integrar a lista de atividades essenciais em maio de 2020. Assim, inicialmente, a indústria de agregados se preparou para uma queda de demanda causada pelo isolamento social, restrições de circulação, paralisação e adiamento das obras. Grata surpresa:  houve crescimento da demanda em várias regiões, como em São Paulo, onde o primeiro semestre do ano fechou com 10,2% de crescimento em relação ao mesmo período de 2019.

Além da taxa Selic se encontrar no nível mais baixo de sua história, o bom resultado provavelmente deve-se a: 

  • A autoconstrução (residencial e comercial);

  • A maior permanência das pessoas em suas casas gerou a necessidade de modificações para agregar novas funções além de moradia: salas de aula, home-office e área de lazer;

  • Muitos imóveis comerciais tiveram que adaptar suas instalações para se adaptar às novas exigências de distanciamento, oferta de serviços de entrega, E-commerce, entre outras demandas;

  • Retomada das obras de empreendimentos imobiliários pelas construtoras, como indica, por exemplo, o Índice de Confiança da Construção (ICST), da Fundação Getúlio Vargas, que avançou 6,6 pontos em julho, alcançando 83,7 pontos. Após quatro meses em queda, este índice voltou a apresentar crescimento em médias móveis trimestrais, de 70,0 para 76,3 pontos. Acrescente-se que, de acordo com o Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), o Brasil fechou 10.984 vagas com carteira assinada em junho, mas o setor da construção civil criou 17.270 novos empregos. As admissões cresceram 29,3% ao passarem de 87.526 trabalhadores em maio para 113.162 em junho. Por outro lado, as demissões recuaram 11,6%.

  • Incremento no financiamento imobiliário com recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE). De acordo com a Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), o volume de empréstimos avançou 28,6% na comparação do primeiro semestre de 2020 em relação a igual período de 2019, alcançando R$ 43,4 bilhões.

Entretanto, a taxa de desemprego avançou de 11,6% para 13,3% no Brasil no segundo trimestre de 2020, em meio à pandemia do novo coronavírus, atingindo o maior nível em três anos conforme dados do IBGE de junho de 2020.

O novo normal

Independentemente de a indústria da construção entrar em um novo normal ou voltar ao antigo normal, as empresas devem agir agora e aproveitar a crise como uma oportunidade para projetar o futuro do setor. De maior rigor na segurança do local de trabalho a mudanças na forma e métodos de trabalho, o vírus mudou muitas facetas da indústria. Não haverá retorno ao mundo pré-Covid. Os locais de trabalho serão mais limpos, com menos pessoas e mais seguros com novas políticas de trabalho, como turnos escalonados, verificações de temperatura de funcionários e desinfecção dos locais de trabalho, ferramentas e máquinas. Novos protocolos serão estabelecidos para promover o distanciamento social e a saúde dos funcionários, como uso de máscara e luvas, estações de lavagem das mãos, transporte adequado.

Já são perceptíveis também as mudanças nas demandas do mercado. Há poucos meses, a urbanização e o consequente crescimento das cidades eram vistos como principais alavancas da expansão econômica nos próximos anos. Havia uma forte tendência de deslocamento das pessoas dos pequenos municípios rumo às cidades maiores em busca de melhores condições de vida e acesso à educação, ao emprego e a outros serviços. Todos os projetos eram desenvolvidos com base nesse movimento:  moradias verticais com elevada taxa de ocupação da área construída, concentrando muitas pessoas para compartilhamento da infraestrutura, mobilidade urbana altamente focada em transporte coletivo. 

No mundo pós-Covid observa-se uma pressão para movimento em sentido inverso. Para manter o distanciamento, as pessoas querem morar afastadas das áreas densamente povoadas, de preferência em moradias horizontais onde possam ter espaço para lazer priorizando o transporte individual em detrimento do transporte público. A taxa ideal de ocupação nos escritórios e o uso racional dos elevadores vão consolidar o home office e interações remotas, com reuniões por videoconferência e menos viagens. Muitos cursos serão predominantemente ministrados à distância. Vários novos condicionantes vão levar as pessoas a desejar moradias maiores que comportem estes ambientes, além de resgatar o antigo vestíbulo para troca de calçados.

A crise provocada pela Covid-19 não se compara a nenhuma outra, ao menos em passado recente. Mudou o comportamento e as expectativas das pessoas.  Algumas mudanças se tornarão permanentes. 

  • As cadeias de suprimentos serão mais locais que globais. As empresas buscarão diversificar seus fornecedores e favorecer os fornecedores locais, mesmo a custos mais elevados, evitando guerras tarifárias e comerciais.

  • A tecnologia será a principal ferramenta. O acesso e a capacidade de trabalhar online se tornarão ainda mais importantes e aqueles que não conseguirem navegar no mundo digital ficarão ainda mais à margem da economia formal.

  • Compras, bancos, trabalho, estudo, consultas, academia, lazer e outros serviços online serão cada vez mais utilizados. Aqueles que se ajustarem a realizar suas atividades online provavelmente não voltarão. Portanto, os imóveis comerciais e algumas utilidades urbanas sofrerão mudanças a longo prazo.

  • O distanciamento será a norma, via tecnologia.  Podemos esperar menos atividades em grupo e procedimentos e protocolos mais claramente definidos, mesmo para algumas das tarefas de trabalho mais rotineiras.  Já há empresas de construção implementando tecnologia remota para inspeções, uma tendência que continuará após o fim da crise de saúde. Na produção, a tendência de automatizar as operações será mais forte.

Que impacto essas novas demandas terão nas novas construções? Onde e como as pessoas vão preferir morar? Haverá realmente uma migração do modelo verticalizado para um mais horizontal? Essas mudanças serão permanentes? Como suprir os materiais de construção necessários nessa nova configuração?

Essencial para o desempenho positivo da economia e segundo maior empregador no país, a construção civil vai contribuir significativamente para reduzir a taxa de desemprego, atualmente de mais de 13 milhões de pessoas, e contribuir para a retomada da economia.

O novo Marco Legal do Saneamento, aprovado pelo Congresso no final de junho, vai gerar demanda significativa para o setor de agregados. Segundo o ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, “As obras civis vão ser intensas e os investimentos no setor vão ocorrer em todo o país. Isso vai dar bastante demanda para a mineração brasileira”.

A demanda reprimida por agregados é enorme. Em 2013 o consumo per capita de agregados foi de 3,7 toneladas por habitante. Em 2019 foi de apenas 2,5 toneladas. A média mundial é de 6 toneladas por habitante.



No Brasil existe uma falsa percepção de que os recursos de areia e rochas são abundantes e inesgotáveis e que seria fácil encontrar ou relocar as minerações. Muitas reservas de agregados são impedidas de serem aproveitadas devido à falta de planejamento, zoneamentos restritivos e competição pelo uso do solo, empurrando os produtores de agregados a distâncias cada vez maiores dos centros consumidores, aumentando os custos de frete. Para garantir o suprimento destas matérias-primas minerais, é imperativo que tenhamos um ordenamento territorial, começando pela preservação das jazidas existentes e levantamentos sistemáticos dos recursos disponíveis de areia e rochas adequadas para construção nos principais aglomerados urbanos do país. O desafio é garantir a disponibilidade de agregados a preços compatíveis com produtividade, segurança e sustentabilidade.

Depois de qualquer período prolongado de crise, há um forte desejo de renascimento e renovação. Há uma demanda reprimida por produtos e serviços; as pessoas estão ansiosas para voltar a trabalhar, investir e fazer compras. Felizmente, esse renascimento também faz parte do novo mundo.





Fernando M. Valverde é Presidente Executivo da Anepac e membro do Conselho Consultivo de Brasil Mineral.









Fonte: Artigo publicado por Brasil Mineral

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