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Fake Mining

Desde que o Talibã tomou a capital do Afeganistão no dia 15 de agosto, começou a circular uma notícia nos meios de comunicação dos Estados Unidos, sem fundamento, que o novo governo local teria à sua disposição US$ 1 trilhão de dólares em bens minerais. A primeira coisa que me ocorreu é: onde vão arrumar US$ 300 bilhões (e gente especializada) para realizar essa fortuna em minérios.


Não precisei pensar muito. Poucos dias depois várias agências noticiosas vieram com a versão correta. Esses números são de 2010 e apareceram em uma manchete do jornal New York Times, e se baseiam em um memorando do Pentágono, de 1977, e em um mapa geológico desenhado por soviéticos. Poderiam ter, pelo menos atualizado o montante, aí teríamos US$ 1,25 trilhão, considerando a inflação nos EUA de 2010 até hoje.

Como disse o Financial Times, na semana passada, a maior parte dos dados geológicos são da década de 1980 e coletados por equipes soviéticas. Contudo, o jornal britânico traz números interessantes sobre lítio: o país teria reservas equivalentes à da Bolívia, 21 milhões de toneladas. Outra coisa em comum com o país andino é que nenhum dos dois tem saída para o mar.

O Afeganistão também teria 12,4 milhões de toneladas de cobre na forma de recursos. Uma parte está sendo pesquisada pelas mineradoras China Metallurgical Group e Jiangxi Copper Company. Contudo a jazida está em uma região que é marcada como patrimônio da Unesco em Mes Aynak, que em persa significa "pequena fonte de cobre". Nem precisava de geólogo para achar esse depósito.

Cobre e lítio em abundância poderiam tornar o país muito atraente, caso fosse estável. O único ano em que o Afeganistão aparece no ranking de atratividade de investimentos em mineração do Instituto Fraser foi 2016. Naturalmente, ficou entre os dez piores lugares do mundo para se investir no setor, à frente somente da Venezuela e de três províncias argentinas. As melhores notas do Afeganistão foram nos critérios de legislação ambiental e cobrança de tributos.

Como diz a máxima: minério sob o solo não vale nada. Logo, o país vai continuar pobre por mais um bom tempo. Meu palpite é que a melhor chance de o Afeganistão se integrar economicamente ao mundo é se aproveitar da proximidade com a Nova Rota da Seda.


Espertamente, a iniciativa chinesa conhecida como Belt and Road Initiative (BRI) evita o conturbado Afeganistão, uma vez que prevê uma rota no Paquistão; outra passando pelo Turcomenistão, Irã e Turquia, para chegar à Europa; e outra via Cazaquistão e Rússia, em direção ao norte da Europa. O BRI prevê investimento de trilhões para reconectar a Ásia à Europa com infraestrutura de transporte, logística e telecomunicações, além de investimentos em hospitais, escolas, transporte urbana e produção de matérias-primas para viabilizar tudo isso.

Além da história do US$ 1 trilhão, circularam imagens de soldados americanos posando com barras de ouro em referência a tesouros que teriam sido apreendidos do Talibã. Nesse caso, trata-se da uma tentativa de requentar uma fake news de antanho. São imagens de 2003, quando a guerra dos EUA contra o Iraque de Saddam Hussein teve um desfecho, mas as barras eram na verdade de cobre e de zinco. Ou seja, uma notícia falsa com 18 anos, que atingiu a sua maioridade.

No Brasil, também circularam algumas fake news sobre minérios e mineração. Em uma delas, Bolsonaro revelou que Lula teria vendido, de forma secreta, direitos minerários a empresas do Canadá em 2008. Em outros boatos, surge o mito de que a Amazônia foi internacionalizada e seria ocupada por ONGs ou outros países. Em outra, Roraima teria nióbio e petróleo que estavam sendo roubados por Venezuela e Cuba.

O nióbio, que tem um mercado estável, é estrela de várias fake news. Uma delas diz que o nióbio pode salvar o Brasil e nos tornar o país mais rico do mundo. Todas essas balelas têm características em comum: são alarmistas, não citam fontes ou provas, não têm datas, aparecem exclusivamente em redes sociais ou blogs obscuros. O principal objetivo é confundir e levar à desinformação, bem como favorecer alguém, um partido ou um grupo.

O fato é muitas pessoas acreditam em tudo que recebem. Parte da explicação está em uma "pegadinha" que o nosso cérebro prega em nós. Uma delas se chama viés de confirmação, uma situação em que nossas crenças e desejos afetam nossa capacidade de julgamento e discernimento, interferindo na capacidade de distinguir o verdadeiro do falso, o certo do errado.

Outro fato é que fake news são mais velhas do que andar para frente e continuarão a existir. Está com dúvida se uma mensagem é mesmo séria? Pesquise a fonte, procure em outros lugares, leia com cuidado, verifique a data e dê uma olhada em websites que caçam notícias falsas, como o e-farsas.com, Agência Lupa e o boatos.org.


Fonte: Notícias de Mineração do Brasil

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