
O Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Federal (PF) investigam o funcionamento de uma das maiores empresas compradoras de ouro no maior polo da mineração ilegal no Brasil, a bacia do Tapajós, no sudoeste do Pará. De acordo com o MPF, há um “completo descontrole” do país sobre esta cadeia econômica, responsável por prejuízos financeiros, sociais e ambientais de proporções devastadoras.
Coletadas durante três anos pelo MPF) e pela PF, uma série de provas sobre a frágil regulamentação, bem como a execução do papel fiscalizador do Estado, foram reunidas em duas ações propostas à Justiça Federal em Santarém (PA) em maio e julho deste ano.
Uma ação, na área criminal, foi ajuizada contra os responsáveis por um posto de compra de ouro da empresa Ourominas em Itaituba (PA), acusados de formarem uma organização criminosa para fraudar documentação e, assim, acobertar a origem clandestina do ouro. De acordo com o MPF, entre 2015 e 2018, o grupo fraudou a compra de 610 quilos do metal, causando um prejuízo de R$ 70 milhões à União.
A outra ação, na área cível, foi proposta contra a Agência Nacional de Mineração (ANM), a União, o Banco Central, o posto de compra e a Ourominas.
Manual
Nesta ação, o MPF cita trechos de um manual de atuação da instituição para o combate à mineração ilegal. O documento foi elaborado pela força-tarefa Amazônia do MPF, integrada por procuradores da República de todos os estados da região, que fizeram um diagnóstico aprofundado sobre os problemas, indicando soluções para a questão.
Como ainda não contam com um sistema informatizado, os procedimentos atuais para o controle da compra, venda e transporte do ouro são um campo fértil para fraudes.
As notas fiscais são preenchidas manualmente, à caneta. O máximo de tecnologia exigido pela legislação para a confecção dos documentos da cadeia do ouro é a máquina de escrever e o papel-carbono. As notas fiscais em papel ficam estocadas com os compradores. Não há nota fiscal eletrônica, não há acesso automático às informações pelo poder público, e muito menos cruzamento de dados.
A atividade garimpeira sequer é definida de modo claro na legislação, permitindo que a atuação de uma empresa mineradora de porte industrial tenha seus impactos considerados equivalentes à atividade de um garimpeiro artesanal.
Não há limites para a emissão de autorizações de exploração de lavra: uma mesma pessoa ou cooperativa pode ser detentora de quantas permissões de lavra conseguir registrar em seu nome.
Também não há controle sobre o uso das permissões de exploração, facilitando muito o "esquentamento" do ouro clandestino. As permissões continuam em vigor mesmo que as áreas não tenham sido exploradas, ou que seus detentores não apresentem relatórios de produção, ou que apresentem relatórios zerados ou incompatíveis com a quantidade de minério indicada em notas fiscais.
A legislação prevê a criação de um sistema de certificação de reservas e de recursos minerais. No entanto, o sistema ainda não está criado. Houve consulta pública no final de 2018, e a avaliação das propostas está a cargo da ANM.
Impactos
Além dos prejuízos financeiros bilionários para o país, dos graves riscos à saúde da população, e das invasões a áreas protegidas, a mineração ilegal estimula uma série de outros problemas socioambientais: desmatamento ilegal - que já eliminou 20% da cobertura vegetal original da Floresta Amazônica -, assoreamento de rios, grilagem (usurpação de terras públicas), conflitos agrários, trabalho insalubre, trabalho escravo, tráfico de pessoas e exploração sexual, doenças como malária, leishmaniose, e as sexualmente transmissíveis (DSTs), entre outras consequências. As informações são do MPF.